Afinal não me dei bem com essa treta do "Rest in Peace". O meu autocolante "Pole Position" torna-me irrequieta em demasia para aceitar de bom grado isso de paz eterna. Eu quero é queimar gasolina, muita estrada e boas curvas, daí que pedi ao meu protector que me devolvesse à vida terrena e se possivel com uma roupagem girita já que os vinte e tal anos com que conto são para ser vaidosa. Senão vou ser quando? Aos cinquenta como uma amarelada que se meneia aqui pela garagem?
Não pensei que pudesse é ser tão moroso e invasivo.
Despojada de todo e qualquer componente, peeling total, base, corrector, cremes hidratantes, rimel, eyeliner, you name it.
Em compensação os artistas foram do mais querido. Sempre gentis perguntavam: magoa? a cada parafuso, anilha ou vedante.
Aos poucos fui-me reconhecendo de novo. Pés... pneus, mãos... manetes, olhos... faróis, rabo... para-choques.
Mas continuava ligada às máquinas, claro, até que o vislumbrei! O meu coração (também o ouvi chamar motor), a brilhar com um esplendor tal que me ofuscou e a prometer um vigor como já não sentia há décadas.
Parafuso após parafuso a parafernália de peças que em caixas me rodeava foi desaparecendo na mesma proporção em que eu me sentia cada vez mais completa.
Ouvia os primeiros sons, sentia as primeiras vibrações. Que saudades! Um último retoque, mais um autocolante. Estava ansiosa por esticar as molas.
A primeira vez foi estranha, não má, apenas estranha. O circuito eléctrico em tensão, as tubagens sob pressão. Primeira, segunda, terceira. As relações da caixa de velocidades a seguirem-se num ritmo certo, as jantes tontas da rotação e de repente o vento! Sim, o ar que eu tanto ansiava transformou-se em vento e que bem que sabia. Na primeira curva a inclinação fez-me temer pelos substitutos dos Zippy, na primeira travagem o Ferodo dos novos travões provou o que valia.
Estava pronta.
Onde está a estrada?
Vamos?
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